Criatividade é dom ou habilidade?
Saulo Bernardo
A criatividade, por muito tempo, foi vista como um dom inato reservado a artistas, inventores e gênios — algo quase místico, que surgia espontaneamente nas mentes brilhantes. Contudo, nas últimas décadas, estudos nas áreas de psicologia, educação e neurociência vêm desmistificando essa ideia. Hoje, já se pode afirmar com segurança: criatividade não é apenas um talento natural, é também uma habilidade que pode ser aprendida, desenvolvida e aperfeiçoada ao longo da vida.
Claro que algumas pessoas parecem nascer com maior facilidade para pensar de forma criativa, assim como outras têm mais aptidão para esportes ou matemática. No entanto, isso não significa que a criatividade seja exclusiva de poucos. Assim como treinamos os músculos no corpo, é possível treinar a mente para pensar fora da caixa, fazer conexões inusitadas e encontrar soluções originais para problemas do dia a dia. A criatividade está presente em todas as áreas — da arte à ciência, da pedagogia ao empreendedorismo — e, mais importante, está ao alcance de todos.
É nesse contexto que surge a Ciência da Criatividade, um campo interdisciplinar que estuda, de forma sistemática, como o pensamento criativo funciona, quais são os processos cognitivos envolvidos, como o ambiente influencia a geração de ideias e, principalmente, como podemos ensinar e estimular a criatividade em diferentes contextos. Essa ciência se apoia em áreas como psicologia cognitiva, neurociência, pedagogia, design, filosofia e até inteligência artificial.
Um dos principais focos da Ciência da Criatividade é compreender os fatores que inibem ou potencializam o pensamento criativo. Ambientes rígidos, medo do erro, excesso de julgamento e pressão por resultados imediatos são alguns dos bloqueios mais comuns. Por outro lado, ambientes colaborativos, estímulos diversos, liberdade para experimentar e aceitação do erro como parte do processo são elementos que favorecem a inovação. Estudos de pesquisadores como Mihaly Csikszentmihalyi, criador do conceito de "fluxo", e Teresa Amabile, especialista em criatividade no trabalho, ajudaram a estabelecer modelos teóricos que explicam como a criatividade emerge e se manifesta.
Nas escolas e universidades, o ensino da criatividade ainda é um desafio. O sistema educacional tradicional, muitas vezes baseado em memorização e respostas únicas, precisa evoluir para valorizar o pensamento divergente, o questionamento, a curiosidade e a autonomia dos alunos. E é justamente esse o papel da Ciência da Criatividade: fundamentar práticas pedagógicas mais abertas, explorar metodologias ativas e preparar professores para se tornarem mediadores do pensamento criativo.
Portanto, a criatividade não deve ser encarada como um privilégio de poucos, mas como uma competência essencial do século XXI, que pode — e deve — ser cultivada desde a infância. A Ciência da Criatividade nos mostra que inovar, imaginar e criar são capacidades humanas universais, e que aprender a ser criativo é, em última instância, aprender a transformar o mundo ao nosso redor.
Em outras palavras, a criatividade se aprende. E mais: ela é uma trilha, não um trilho — feita de tentativas, descobertas, erros e reinvenções.